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Morte súbita interrompida

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O sentido da vida é muito simples, é o Amor. A Esperança encontra-se facilmente, no Amor.

O sentido da vida é muito simples, é o Amor. A Esperança encontra-se facilmente, no Amor.

O que têm em comum a cantora Dolores O’Riordon, o ator Antonio Firmino,e os futebolistas Mar-Vivien Foe e o Miklos Feher?

Todos faleceram de morte súbita. Na grande maioria dos casos, a causa tem origem no coração. Chama-se morte súbita a qualquer evento que leve um individuo a falecer de forma inesperada e relativamente rápida.

Na minha vida, tal qual como a maioria das pessoas, a morte súbita está sob a forma de uma notícia, um acontecimento que ocorre noutra pessoa e nunca connosco. Até que num dia, a morte súbita te bate à porta.

No dia 11 de Agosto de 2017, quase perto da meia-noite, recebia um telefonema estranho. Ligavam-me perto da meia-noite, um pouco tarde para estar a ligar à meia-noite, mas se calhar era uma amiga para acertar a hora que iriamos ver as estrelas cadentes no Cabo da Roca, no dia seguinte.

Atendo e do outro lado, estão a chorar … No meio do choro e de soluços, dizia-me que o meu irmão Gémeo, que estava em Cabo Verde na ilha da Boavista de férias, tinha tido um acidente e estava em coma. Não se sabia como ocorreu o sucedido, estava em perigo de vida e necessitava urgentemente de cuidados médicos, necessitava de um Hospital.

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De um momento para o outro, o meu companheiro de vida, o meu irmão do mar, aquele que partilha comigo as ondas, sempre juntos no Sumo da Vida, esteja pequeno ou grande, seja off-shore ou on-shore, está com a vida por um fio.

De um momento para o outro, ocorre-me que a vida do meu irmão poderá acabar aos 42 anos… Juntos há tanto tempo, desde bebê, o meu irmão gémeo vai terminar a vida, nada será como antes, a partir daqui terei uma cicatriz que me vai rasgar a alma.
Numa batalha durante a noite mal dormida, foi possível agendar um avião Hospital para Tenerife, o local mais próximo com um Hospital com capacidades médicas, até lá terá de ficar na Ilha da Boavista. Nunca pensei na dificuldade de reservar um avião Hospital e que o desespero pode nos levar a dizer, que sim a tudo. Tenerife é o meu destino, chegarei no Domingo por volta das 14h locais.

Entretanto já sei que o meu irmão ia dar uma corrida ao final do dia, enquanto o resto da família gozava os últimos momentos na piscina. Aparentemente alguém do Hotel convidou-o para jogar à bola e logo nos minutos iniciais, quando a bola rolava, olharam para trás e viram o Bruno caído no chão, inanimado. Também por sorte um hóspede, que teria sido convidado à última hora, foi imediatamente chamar uma prima Enfermeira, também hospedada no hotel, que num ápice se prontificou para prestar os primeiros socorros. Esta primeira ajuda foi fundamental, pois conseguiu reanima-lo e estabiliza-lo. Neste momento apenas sei que estava em coma e a necessitar de cuidados médicos.

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Chego a Tenerife, apanho um táxi e em minutos estou no Hospital. Ocorre-me o pensamento: “Será que já cheguei tarde?”. É a pergunta que faço a mim… No elevador tento encher o peito, “Tenho de ser forte, ele precisa de mim!”. Antes de entrar, falo com a enfermeira de serviço e diz-me que as noticias não são boas e a médica traçou o pior cenário possível… Estou numa situação desesperada e já perto do quarto, respiro fundo antes de entrar.

Numa cama cheia de tubos, vejo o Bruno todo ligado, com máquinas e gráficos, num apito monocórdico. O cenário é “dantesco”, não sei se choro, mas por dentro grita de raiva. Olho para o meu irmão e vejo uma pessoa inerte, que de vez em quando convulsiona, um corpo que respira por uma máquina, mas que não tem vida, um corpo que está em coma. Olhas para um corpo que não está a dormir, um corpo deitado de olhos fechados, sem alma, sem lógica, sem dor, que vai se mexendo como se fosse um zombie… Sim, um zombie! Sabes que mãos de 3 minutos sem oxigénio no cérebro, são fatais para qualquer pessoa e que danos irreversíveis podem acontecer. Não será melhor a morte?

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Viro-me para a janela e começo a chorar, não aguento, tenho de soltar algumas lágrimas, mas não posso chorar à frente dele. Olho lá para fora, choro e aperto o coração. O que é isto?! Como é possível uma pessoa ficar num estado pior do que a morte? Não há palavras para descrever a minha dor… Limpo os olhos e respiro fundo. Volto-me para o meu irmão e pego na mão dele. “Estás tudo bem mano, eu estou aqui para ti!
Pouco mais há para fazer, resta-me a esperança e dia-a-dia procurar notas positivas, pequenas vitórias, para não desesperar. Encosto a minha cara à dele, levo a mão dele à minha cara e faço festas. Dou aquilo que consigo, dou-lhe o meu amor e tento sorrir, passar energia positiva, transmitir boas vibrações e acreditar que ele está-nos a ouvir, bem lá no fundo. “Eu estou aqui contigo meu irmão!”.

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A rotina de Tenerife é acordar, tomar o pequeno-almoço e vaguear pelas ruas, à espera do início da visita no Hospital. Depois é tentar falar com o Médico e ver que evoluções ocorreram. Depois é ir à procura de um sítio para almoçar, fazer mais um pouco mais de tempo e fazer a visita ao final de tarde, também à procura de evoluções. Após a última visita é decidir onde ir jantar e digerir as informações passadas ao longo do dia, sem esquecer nos telefonemas, mensagens e pontos de situação que vamos dizendo o dia todo. São muitos que pensam no Bruno, são muitos que enviam energia positiva que nos dão esperança, daquilo que não sabemos o que vai acontecer, do futuro incerto de uma pessoa que está em coma e que esteve mais de 3 minutos sem oxigénio e mais de 24 horas a necessitar de cuidados médicos intensivos.

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Saio de Tenerife a perceber a realidade de uma pessoa em coma, a perceber de uma forma geral os vários estados do coma, que pequenas evoluções são grandes vitórias e a ter cuidado com as palavras que uso. Em vez de usar “abre os olhos”, deveria ter dito “abre as pestanas”; ou então que o largar um sorriso é muito perigoso, pois a maioria das pessoas não sabe que este tipo de acções são básicas e não significam que já acordaram do coma. Acordar do coma é muito mais que isso, é apenas um inicio de uma vida nova e a possibilidade de começar de novo, e que o processo evolutivo é feito de altos e baixos, que uns dias podes estar melhor e outros dias pior.
O acordar do coma do Bruno começou devagar, começou quando chegou a Lisboa, no dia 25 de Agosto de 2017. Em Lisboa, sem o ver durante 1 semana, durante as minhas visitas, percebia que estava bem melhor e que começava realmente a interagir, completamente diferente do estado em que estava. No Hospital de Santa Maria ficavam doidos com tantas visitas que recebia e muitos choravam pelo estado em que estava. Eu tentava mostrar o lado positivo e dizia que estava bem melhor.

 

É no dia 3 de Setembro 2017 que senti que o Bruno finalmente tinha acordado do coma, foi nesse dia que pude respirar de forma livre, que pude olhar para o mar e ver o oceano diante dos meus olhos, é neste momento que o relatório médico “morte súbita interrompida”, duas palavras juntas que jamais vou esquecer, para mim começou a fazer sentido. Olho para trás e parece que foi há muito tempo, mas foi uma evolução meteórica de um Campeão da Vida! Desde o começar a trabalhar, a ir para o trabalho sozinho, a começar a zangar-se e até a conduzir.

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E hoje, dia 21 de Janeiro de 2018, passados 5 meses e 10 dias, reiniciamos as nossas vidas. Hoje foi o dia de regresso ao mar, de voltarmos ao nosso sumo da vida para fazermos aquilo que nos faz feliz. Tudo é passado e a partir de hoje e até nos deixarem, vamos lá estar todos dentro de água a deslizar na energia de ondas positivas.
Todos juntos na água estamos felizes, my liquid brothers!

Eu acredito em segundas oportunidades, e quando estiver em baixo, vou fechar os olhos e recordar este momento, vou recordar que nem todos têm uma segunda oportunidade, vou recordar que a vida é mais importante que tudo e nunca vou parar de Surfar…

Sabes bem que a vida só começa quando começas a Surfar!

Por Tiago Lee Lai

Bruno Lai é comunicador português do Blogg Palavras de Sal




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